Antes de tudo, é necessário ter em mente que abordar a questão das mensalidades em uma universidade como a PUC-SP não implica em simplesmente atender à superficialidade corporativista de melhor elucidar a relação entre uma empresa, seus clientes e o valor do produto colocado à venda. Trata-se de abordar a forma mais elementar de entender a função social de um espaço de ensino que se apresenta institucionalmente comunitário e filantrópico, e que possui um corpo administrativo cujos discursos, em tempos de campanhas, se diz zelar por tal caráter. Discutir as mensalidades é, portanto, entender criticamente, no sentido de uma análise rigorosa, o que a PUC-SP é no meio social no qual está inserida.
Um primeiro olhar sobre o valor médio das mensalidades, sem maior atenção às especificidades da instituição, escancara algumas obscenidades. Em média, o preço que uma pessoa paga para estudar na PUC-SP é de R$1.200,00. O salário mínimo estipulado no Brasil é de R$510,00, valor bruto recebido por aproximadamente 45% da população. Este valor cobrado, portanto, impede que 75 milhões de pessoas tenham acesso a este espaço. A mensalidade da PUC-SP, tal qual é posta hoje, funciona como um eficiente instrumento de exclusão.
Atentemos ao caráter filantrópico da universidade. Uma das funções que tal atributo lhe obriga cumprir é ter a preocupação com a abertura de amplos editais de bolsas de estudo. É pressuposto a uma universidade filantrópica garantir o acesso e permanência de todos e, principalmente, daqueles que não podem pagá-la. No entanto, o que se vê hoje na PUC é uma diminuição drástica do número de bolsas oferecidas pela instituição e um aumento do número de bolsas oferecidas pelo PROUNI.
Deve-se esclarecer uma distorção aqui estabelecida: A diferença entre os dois tipos de bolsas é que aquelas oferecidas pela universidade cumprem com a obrigação filantrópica da PUC-SP e, já que são institucionais, torna-se muito mais fácil pressionar os setores administrativos da PUC para que as bolsas sejam completas, garantindo não apenas as mensalidades, mas também a permanência dos estudantes na universidade. O PROUNI, que, supostamente, tem o propósito de incluir classes menos favorecidas, estimula a expansão organizativa de universidades privadas de acentuado caráter mercantil devido à isenção fiscal oferecida pelo programa.
Há uma completa inversão de sentidos entre o que a universidade se diz ser e o que cumpre em sua lógica operatória administrativa. Em 2007, a ex-reitora Maura Véras decretou a perseguição de alunos inadimplentes, determinando o não pagamento em dia de mensalidades como justificativa para impedir a renovação de matrículas e, conseqüentemente, o acompanhamento de disciplinas. Tratou-se de uma expressão truculenta sobre o que esta lógica operatória tem por sentido, escancarando a que veio. Tais medidas absurdas não apenas foram preservadas, como reafirmadas na atual gestão da reitoria, perpetuando uma lógica de truculência criticável em diversos aspectos.
É necessário ponderar que a atual estrutura administrativa da universidade favorece que tais medidas sejam homologadas sem grande esforço por parte do Conselho Superior Administrativo (CONSAD) – hoje, a grande expressão do estrangulamento de espaços democráticos historicamente construídos nesta instituição. A facilitação de ações que reforçam o caráter elitista, excludente e antidemocrático da organização institucional da PUC-SP é acompanhada da naturalização destas características, que se reforçam na comunidade puquiana, criando-se um senso comum de indiferença ante o avanço de tais medidas.
O cumprimento da função social desta universidade, cujos esforços para deturpá-la e obstruí-la parecem não ter limites, dependem de uma re-instauração de um debate sobre a lógica administrava da PUC-SP, entendendo-a como elemento que contribua para a preservação da vida social da comunidade, e não de cerceamento e entrave. Neste sentido, a questão das mensalidades é uma via de acesso para reivindicar uma postura minimamente coerente sobre o que esta universidade deseja ser diante da compreensão da ordem social onde está inserida, postura esta que foi abandonada e esquecida por seus administradores, que optaram pela inércia dos dispositivos técnicos ativados em momentos de crise.
O silêncio dos estudantes e o marasmo da vida cotidiana universitária, hoje completamente esvaziada de debates sobre o que é, o que representa e o que deseja ser, cada vez mais se tornam cúmplices desta lógica administrativa e deste estado de coisas. Aproxima-se a passos largos o dia em que se tornará insustentável preservar o que um dia já foi a universidade brasileira mais dinâmica e aberta, cuja lógica de funcionamento propôs alternativas para entender a realidade existente. Convidamos a todos a reivindicar que este dia não chegue.
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